16.3.09

O baloiço


Na sala de espera do dentista há uma porta em pvc que dá para um largo pátio de traseiras de primeiro andar. Entre as sardinheiras e as hortênsias que se encostam ao varandim verde, existem bancos de jardim. Ao centro, um suporte, também verde, com duas cadeiras de baloiço suspensas por grosso cadeado de ferro. Andorinhas cruzam o céu azul, azul, em vôo rasante.

A garota chega com a mãe, ambas gorduchas e coradas. Ao vislumbrar o baloiço, enquanto a mãe procura um dos bancos e se dispõe a ler, a criança berra, sentando-se: - mãe anda pr'aqui. A mãe responde que não, que fica tonta se estiver a ler e a andar de baloiço. A filha reclama: - mas anda pr’aqui que eu quero estar ao pé de ti, ouviste?
- Se queres estar ao pé de mim, vem sentar-te aqui, que se está bem – diz a progenitora. Que não, que quer estar ao pé da mãe, mas não é no banco, é ali, no baloiço.
O tom de voz da miúda corada e redonda irrita-me solenemente, pelo que traduz de sobranceria, falta de respeito e mimalhice. Balança-se aos círculos, pé no chão a dar impulso, pé no ar a embalar-se.
– Porque é que demora? Vai lá dizer pra nos atenderem. A mãe olha a garota em jeito de repreensão, mas ela não se deixa intimidar: – que é que foi? Já estou farta de esperar. E qual é o aparelho que vão pôr? Eu quero um com coisinhas azuis.
- Ó Beatriz, achas que a cor é importante? O dentista ainda nem te disse se precisas de usar um.
- Mas se me comprares um eu quero azul, que é a cor de quase todos os dos meus colegas lá na turma. E a cor dos aparelhos muda porquê?
- Se calhar é diferente consoante o problema que têm nos dentes.
- Ah, então toda a gente tem o mesmo problema lá na turma, não? São todos azuis. Mami, ouviste?, anda pr’aqui, já te disse. E continuava a actuar, qual actriz principal.
Resolvi parar de fitar a miúda, fechei os olhos e dispus-me a descansar um pouco enquanto esperava pela minha vez. Três segundos. Uns míseros três segundos e a coradinha foi a correr para junto da mãe, agarradinha ao braço, cabecinha no ombro, perninhas a balançar, sentada. O público dormia.

Eu precisava era de tratar a dor de cabeça e fui pedir um Panadol à recepcionista. – Está a doer muito, o dente?
Sorri, a dizer que era só um bocadinho. E não quis mais saber das andorinhas daquele céu.
M.

1 comentário:

JOSÉ RIBEIRO MARTO disse...

...os pequenos ditadorzinhos começam de aparelho nos dentes , não ! E que mãe essa ! Aquela !
mAs melhoras !
abraço , Malina !

________ JRMARTO