Pastelaria
Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura
Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio
Afinal o que importa não é ser novo e galante
— ele há tanta maneira de compor uma estante
Afinal o que importa é não ter medo:
fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício
Não é verdade rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola
Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come
Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!
Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria e, lá fora — ah, lá fora! — rir de tudo
No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra.
Mário Cesariny, Burlescas, Teóricas e Sentimentais, Editorial Presença, 1972
* Miles Davis - Summertime
4 comentários:
Afinal o que importa...?
è não fazer batota com a vida!
Abraço amigo
_______ JRMARTO
Perfeito.Perfeito.Perfeito. Tudo :)
percebeu bem as palavras(minhas...) na escrita do Cesariny. E claro: nunca fazer batota com a vida - esse o compromisso. É que ela ganha sempre:))))
beijinho
e mais uma vez bem haja Marta, por se passear por aqui e nos dar o ensejo de não desistir.
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